10/12/2014

Telperion e Laurelin – As Duas Árvores de Valinor


“E quando Valinor estava pronta, as mansões dos Valar, instaladas no meio da planície do outro lado das montanhas, eles construíram sua cidade, Valmar de muitos sinos. Diante de seu portão ocidental, havia uma colina verdejante, Eellohar, que também é chamada de Corollairë; Yavanna a consagrou, e ficou ali sentada muito tempo sobre a relva verde, entoando uma canção de poder, na qual expunha o que pensava sobre as coisas que crescem na terra. Nienna, porém, meditava calada e regava o solo com lágrimas. Naquele momento, os Valar, reunidos para ouvir o canto de Yavanna, estavam sentados, em silêncio, em seus tronos do conselho de Máhanaxar, o Círculo da Lei junto aos portos dourados de Valmar; e Yavanna Kementári cantava diante deles, e eles observavam.
E, enquanto olhavam, sobre as colinas surgiram dois brotos esguios; e o silêncio envolveu todo o mundo naquela hora, nem havia nenhum outro som que não o canto de Yavanna. Em obediência a seu canto, as árvores jovens cresceram e ganharam beleza e altura; e vieram a florir; e assim, surgiram no mundo as Duas Árvores de Valinor. De tudo o que Yavanna criou, são as mais célebres, e em torno de seu destino são tecidas todas as histórias dos Dias Antigos.
Uma tinha folhas verde-escuras, que na parte de baixo eram como prata brilhante; e de cada uma de suas inúmeras flores caía sem cessar um orvalho de luz prateada; e a terra sob sua copa era manchada pelas sombras de suas folhas esvoaçantes. A outra apresentava folhas de um verde viçoso, como o da faia recém-aberta, orladas de um dourado cintilante. As flores balançavam nos galhos em cachos de um amarelo flamejante, cada um na forma de uma cornucópia brilhante, derramando no chão uma chuva dourada. E da flor daquela árvore emanavam calor e uma luza esplêndida. Telperion, a primeira, era chamada em Valinor, e Silpion, e Niquelótë, entre muitos outros nomes; mas Laurelin era a outra, e também Malinalda e Culúrien, entre muitos outros nomes poéticos.
Em sete horas, a glória de cada árvore atingia a plenitude e voltava novamente ao nada; e cada uma despertava novamente para a vida uma hora antes de a outra deixar de brilhar. Assim, em Valinor, havia uma hora suave de uma luz mais delicada, quando as duas árvores estavam fracas e seus raios prateados e dourados se fundiam. Telperion era a mais velha das árvores e chegou primeiro à sua plena estatura e florescimento; e aquela primeira hora que brilhou, com o bruxulear pálido de uma alvorada de prata, os Valar não incluíram na história das horas, mas denominaram a Hora Inaugural, e a partir dela passaram a contar o tempo de seu reinado em Valinor. Portanto, à Sexta hora do Primeiro Dia, e de todos os dias jubilosos que surgiram, até o Ocaso de Valinor, Telperion interrompia sua vez de florir; e na décima segunda hora, era Laurelin que o fazia.”


O Silmarillion – Quenta Silmarillion – Do início dos tempos – página 31 e 32


Os Drúendain – Parte II

Os eldar os chamavam de drúendain, admitindo-os na classe dos atani, pois forma muito amados enquanto duraram. Ai deles! Não tinham vida longa e sempre foram poucos, tendo suas perdas sido pesadas na contenda com os orcs, que retribuíram seu ódio e se deleitavam em capturá-los e torturá-los. Quando as vitórias de Morgoth destruíram todos os reinos e baluartes dos elfos e dos homens em Beleriand, diz-se que haviam minguado, restando apenas algumas famílias, mormente de mulheres e crianças, algumas das quais foram ter com os últimos refugiados nas Fozes do Sirion.
Nos tempos de outrora, haviam sido de grande valia àqueles entre quem viviam, e eram muito requisitados; porém poucos chegaram a abandonar a terra do Povo de Haleth. Tinham uma maravilhosa habilidade para seguir a pista de todas as criaturas viventes e ensinavam aos amigos o que pudessem de seu ofício. Mas seus pupilos não os igualavam, pois os drúedain usavam o faro como cães, só que também, só que também tinham a visão aguçada. Gabavam-se de ser capazes de farejar um orc a favor do vento mais longe do que outros homens conseguiam ver, e podiam seguir seu rastro por semanas, exceto através da água corrente. Seu conhecimento de todas as coisas que crescem era quase igual ao dos elfos (porém não ensinado por estes); e diz-se que, quando se mudavam para uma nova região, em pouco tempo conheciam todas as coisas que cresciam grandes ou diminutas, e davam nomes àquelas que lhes eram novas, distinguindo as venenosas e as úteis para a alimentação.
Os drúedain, assim como os demais atani, não tinham forma de escrita até encontrarem os eldar. Não chegaram mais perto da escrita, pela sua própria invenção, do que o uso de uma série de sinais, simples na maior parte, para marcar trilhas ou dar informações e avisos. No passado remoto, parece que já possuíam pequenos implementos de sílex para raspar e cortar, e ainda os usavam, pois, embora os atani conhecessem metais e alguma arte da forja antes de chegarem a Beleriand, os metais eram difíceis de conseguir e as armas e ferramentas forjadas eram muito custosas. Mas quando, em Beleriand, pela associação com os eldar e o comércio com os anões de Ered Lindon, tais objetos se tornaram mais comuns, os drúedain demonstraram grande talento para o entalhe em madeira ou pedra. Já tinham conhecimento de pigmentos, principalmente derivados de plantas, e desenhavam figuras e motivos na madeira ou em superfícies planas de pedra; e às vezes raspavam nós de madeira para formar rostos que podiam ser pintados. Mas com ferramentas mais afiadas e mais fortes deleitavam-se em esculpir figuras de homens  e animais, fossem brinquedos e ornamentos, fossem imagens grandes, às quais os mais habilidosos dentre eles conseguiam imprimir um vigoroso aspecto de vida. Às vezes essas imagens eram estranhas e fantásticas, ou mesmo,terríveis: entre as brincadeiras cruéis em que empregavam sua habilidade estava a feiúra de formas de orcs que punham nas fronteiras da região, com aspecto de quem está fugindo dali, uivando de terror. Também faziam imagens de si próprios e as colocavam nas entradas de trilhas ou nas curvas de caminhos na floresta. Chamavam-nas de “pedras vigia”. As mais notáveis delas estavam dispostas perto das Travessias do Teiglin, cada uma representando um drúadan, maior que o tamanho natural, agachado com todo o peso sobre um orc morto. Essas figuras não serviam meramente como insultos a seus inimigos; pois orcs as temiam e criam que estavam cheias do rancor dos Oghor-hai (pois assim chamavam os drúedain), e que podiam se comunicar com eles. Portanto, raramente ousavam tocá-las ou tentar destruí-las; e, exceto quando eram numerosos, davam a volta diante da “pedra vigia” e não iam adiante.
No entanto, entre os poderes desse estranho povo talvez o mais notável fosse sua capacidade total de silêncio e imobilidade, que às vezes podiam suportar por muitos dias a fio, sentados de pernas cruzadas, mãos nos joelhos ou no colo, e olhos fechados ou fitando o chão.  Acerca disso relatava-se um conto entre o Povo de Haleth, o qual contarei na próxima postagem.


- Contos Inacabados – Quarta Parte: Os Drúendain

A Linhagem de Elros: Reis de Númenor – Parte I


Da Fundação da Cidade de Armenelos até a Queda


Considera-se que o Reino de Númenor começou no trigésimo segundo ano da Segunda Era, quando Elros, filho de Eärendil, ascendeu ao trono na Cidade de Armenelos, tendo então noventa anos de idade. Daí em diante ficou conhecido no Pergaminho dos Reis pelo nome de Tar-Minyatur; pois era costume dos Reis assumirem seus títulos nas formas do idioma quenya ou alto-élfico, visto que esse era o idioma mais nobre do mundo, e esse costume perdurou até os dias de Ar-Adû-nakhôr (Tar-Herunúmen). Elros Tar-Minyatur reinou sobre os númenorianos por 410 anos. Pois aos númenorianos fora concedida uma longa vida, e permaneciam infatigáveis pelo triplo da duração dos homens mortais na Terra-média. Ao filho de Eärendil, porém, foi dada a vida mais longa de qualquer homem, e a seus descendentes uma duração menor, e, no entanto maior que a de outros mesmo dentre os númenorianos. Assim foi até a chegada da Sombra, quando os anos dos númenorianos começaram a minguar.

I. Elros Tar-Minyatur
Nasceu 58 anos antes de se iniciar a Segunda Era: permaneceu infatigável até a idade de quinhentos anos e então renunciou à vida, no ano de 442, tendo reinado por 410 anos.

II. Vardamir Nólimon
Nasceu no ano de 61 da Segunda Era e morreu em 471. Era chamado Nólimon pelo fato de sua principal predileção serem as antigas tradições, que recolhia entre os elfos e os homens. Quando Elros partiu, tendo ele então 381 anos de idade, não ascendeu ao trono, mas deu o cetro ao filho. Não obstante, é contado como o segundo dos Reis, e considera-se que reinou por um ano. Depois disso tornou-se costumeiro, até os dias de Tar-Atanamir, que o Rei entregasse o cetro ao sucessor antes de morrer; e os Reis morriam de própria vontade enquanto ainda estavam no vigor da mente.

III. Tar-Amandil
Era filho de Vardamir Nólimon e nasceu no ano de 192. Reinou por 148 anos, e entregou o cetro em 590; morreu em 603.

IV. Tar-Elendil
Era filho de Tar-Amandil e nasceu no ano de 350. Reinou por 150 anos, entregou o cetro em 720; morreu em 751. Também era chamado Partamaitë, pois com sua própria mão fez muitos livros e lendas da tradição recolhida por seu avô. Casou-se tarde na vida, e sua descendente mais velha foi uma filha, Silmarien, nascida no ano de 521, cujo filho foi Valandil. De Valandil vieram Elendil, o Alto, que chegou à Terra-Média após a Queda. No reinado de Tar-Elendil os navios dos númenorianos retornaram pela primeira vez à Terra-média.

V. Ter- Meneldur
Era o único filho homem e terceiro descendente de Tar-Elendil, e nasceu no ano de 543. Reinou por 143 anos, e entregou o cetro em 883; morreu em 942. Seu “nome próprio” era Írimion; assumiu o título de Meneldur por sue amor pelo estudo da estrelas. Casou-se com Almarian, filha de Vëantur, Capitão dos Navios no reinado de Tar-Elendil. Era sábio, porém gentil e paciente. Renunciou em favor do filho, subitamente e muito antes do tempo devido., como ato político, em distúrbios que surgiram, decorrentes da inquietação de Gil-Galad em Lindon, quando este começou a se dar conta que um espírito maligno, hostil aos eldar e aos dúnedain, se agitava na Terra-média.

_ Contos Inacabados – Segunda Parte: a Segunda Era – capítulo III

Ilustração: Ilha de Númenor - Ted Nasmith



Os Arctantropos (Troca-Peles):

Muito pouco se sabe sobre a raça dos arctantropos, no livro O Hobbit, são citados pela primeira vez através do personagem Beorn, chamado por Gandalf de troca-peles. Já seus descendentes (beornings) não são considerados da raça dos arctantropos, Beorn foi o último. Então é sobre esse personagem que vou focar a postagem, trazendo alguns pontos do livro O Hobbit, como argumento.
A definição por Gandalf sobre o homem- urso foi a seguinte:

“Ele é um troca-peles. Ele troca de pele: algumas vezes é um enorme urso-negro, outras é um homem grande e forte, de cabelos negros, com enormes braços e longas barbas. Há pouco mais que eu possa dizer, mas isto deve ser suficiente. Alguns dizem que é um urso descendente dos grandes e antigos ursos das montanhas, que viveram lá, antes da chegada dos gigantes. Outros dizem que é um homem descente dos primeiros homens que viveram antes de Smaug ou os outros dragões viessem para esta parte do mundo, e antes que os orcs viessem do norte e invadissem as colinas. Não sei dizer, embora imagine que a última história seja verdadeira (...)
De qualquer forma, ele não está sob nenhum encantamento, a não ser o próprio. Mora numa floresta de carvalhos e tem uma grande casa de madeira; e, como homem, tem gado e cavalos que são quase tão maravilhosos como ele. Trabalham para ele e conversam com ele. Ele não os come, nem caça ou come animais selvagens. Tem muitas colméias de grandes abelhas ferozes, e sobrevive principalmente de creme e mel. Como urso, percorre um longo e vasto território. Uma vez eu o vi de noite sentado sozinho no topo da Carrocha, observando a luz que afundava na direção das Montanhas Sombrias, e ouvi resmungar na língua dos ursos: “Dia virá em que desaparecerão e eu voltarei!” É por isso que acredito que ele mesmo tenha surgido das montanhas.”

Essa é a descrição que Tolkien trouxe de Beorn. E generalizando para os “troca-peles” eles eram grandes homens durante o dia, e grandes ursos á noite. Como a citação de Gandalf, provavelmente vieram das montanhas (“Dia virá em que desaparecerão e eu voltarei”). No caso Beorn não era carnívoro e tinha um grande respeito pela natureza e por seus animais, sendo que se alimentava basicamente de mel e pão, mas não acho que isso deva ser generalizado para todos os arctantropos.

_O Hobbit, capítulo VII – Estranhos Alojamentos, páginas 113 e 115.

Ilustração: Beorn, de Ted Nasmith




A História de como Melkor corrompeu os elfos, transformando-os em Orcs:


Várias vezes nas obras de Tolkien são citadas que os orcs eram primeiramente elfos, que foram corrompidos pela maldade do até então Senhor do Escuro Melkor.
Quando os quendi surgiram na Terra-média, no Cuiviénen, os Valar demoraram algum tempo até descobrir que os Filhos de Ilúvatar haviam despertado. Já Melkor logo soube, devido a seus vários espiões que estavam em todos os lugares, espreitando cada canto da terra. Certa vez o vala Oromë cavalgava próximo a região do Cuiviénen (que não mais existia), e ao ouvir vozes e cantos se aproximou, sendo que muitos dos quendi sentiram medo e saíram correndo do lugar, os que ficaram fizeram amizade com Oromë que os contemplou e os chamou de eldar em sua própria língua, e os eldar ficaram maravilhados por ver outra criatura que falava. Assim começou a ida das três casas á Valinor, conduzida por Oromë, mas essa não é a questão agora. Os eldar que fugiram de Oromë após a sua chegada, provavelmente foram capturados pelos servos de Melkor e levados a Utumno (fortaleza de Melkor, anterior a Angband) e torturados de todas as formas, gerando assim a terrível raça dos orcs, que apesar de toda sua maldade e fidelidade aos Senhores do Escuro, sempre os detestaram em seu intimo. Um dos motivos de os elfos terem fugido com a chegada do vala, foi que Melkor já os havia aterrorizado com seus servos a cavalo, justo para que quando Oromë se aproximasse, pois costumava cavalgar frequentemente pela Terra, eles sentirem medo e fugirem.
Para encerrar e acrescentar mais algumas informações, aqui está um pequeno trecho de O Silmarillion que confirma o que eu havia dito:

“Entretanto, pouco se sabe daqueles infelizes que caíram na armadilha de Melkor. Pois quem, entre os seres vivos, desceu aos abismos de Utumno, ou percorreu as trevas dos pensamentos de Melkor? É, porém, considerado verdadeiro pelos sábios de Eressëa que todos aqueles quendi caíram nas mãos de Melkor antes da destruição de Utumno foram lá aprisionados, e, por lentas artes de crueldade, corrompidos e escravizados; e assim Melkor gerou a horrenda raça dos orcs, por inveja dos elfos e em imitação a eles, de quem eles mais tarde se tornaram os piores inimigos. Pois os orcs tinham vida e se multiplicavam da mesma forma que os Filhos de Ilúvatar; e nada que tivesse vida própria, nem aparência de vida, Melkor jamais poderia criar desde sua rebelião no Ainulindalë antes do Início. Assim dizem os sábios. E, no fundo de seus corações negros, os orcs odiavam o Senhor a quem serviam por medo, criador apenas de desgraça. Essa poder ter sido o ato mais abjeto de Melkor, e o mais odioso aos olhos de Ilúvatar.”

_O Silmarillion, Quenta Silmarillion – Capítulo III, página 49

Imagem: Orcs