11/11/2014

O Desastre dos Campos de Lis – Parte V

Já de Isildur conta-se que sofreu grande dor e angústia no coração, mas de início correu como um cervo perseguido pelos cães, até chegar ao fundo do vale. Lá parou para se assegurar de que não estava sendo perseguido; pois os orcs conseguiam rastrear um fugitivo no escuro pelo faro, e não precisavam dos olhos. Então prosseguiu com mais cautela, pois uma ampla baixada se estendia na escuridão diante dele, irregular e sem trilhas, com muitas armadilhas para pés errantes.
Assim foi que finalmente chegou à margem do Anduin no meio da noite, e estava exausto; pois fizera um trajeto que os dúnedain, em terreno semelhante, não fariam mais depressa, marchando sem parar e de dia. O rio turbilhonava escuro e veloz, à sua frente. Ficou parado por algum tempo, em solidão e desespero. Então, apressado, lançou fora toda a sua couraça e suas armas, exceto uma espada curta presa ao cinto, e mergulhou na água. Era homem de força e resistência que, mesmo entre os dúnedain daquela época, poucos conseguiam igualar, mas tinha pouca esperança de atingir a margem oposta. Antes de avançar muito, foi forçado a se virar quase para o norte, contra a corrente; e, por mais que se esforçasse, sempre era arrastado para baixo, em direção aos emaranhados dos Campos de Lis. Estavam mais perto do que ele pensara; e, no mesmo instante em que sentiu a correnteza enfraquecer, e quando se havia atravessado, estava se debatendo em meio a grandes juncos e plantas pegajosas. Ali deu-se conta subitamente de que o Anel se fora. Por azar, ou por um acaso feliz, o anel saíra de sua mão e fora aonde Isildur jamais poderia esperar reencontrá-lo. Inicialmente seu sentimento de perda foi tão avassalador que ele não se debateu mais, e teria submergido e se afogado. Mas, ligeiro como havia chegado, esse humor passou. A dor o abandonara. Uma grande carga fora removida. Seus pés encontraram o leito do rio, e ele, erguendo-se da lama, atravessou trôpego o juncal até uma ilhota pantanosa próxima a margem oeste. Ali levantou-se da água: apenas um homem mortal, uma pequena criatura perdida e abandonada nos ermos da Terra-média. Mas para os orcs de visão noturna que se escondiam à espreita, ele se erguia como uma monstruosa sombra de pavor, com um olho penetrante como uma estrela. Atiraram nele suas flechas envenenadas e fugiram. Desnecessariamente, pois Isildur, desarmado, foi trespassado no coração e na garganta, e sem um grito caiu para trás na água. Nenhum vestígio de seu corpo jamais foi encontrado por elfos ou homens. Assim terminou a primeira vítima da malícia do Anel sem dono: Isildur, segundo Rei de todos os dúnedain, senhor de Arnor e Gondor, e o último naquela era do Mundo.

- Contos Inacabados – Terceira Parte: a Terceira Era – O Desastre dos Campos de Lis

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